terça-feira, 18 de março de 2014

Judeus no Brasil

07-notaSinagoga Shaar Hashamaim de Belém do Pará em belíssima foto de Moisés Unger

A lei do deputado federal Marcelo Itagiba criou esta data para lembrar a imigração e contribuição judaicas ao Brasil, como já existia para outras etnias de imigrantes.

Será que você faz idéia das fases desta imigração ou se contenta com as notinhas institucionais deturpadas publicadas por aí?

Não havia judeus no Brasil até 1810 quando Portugal aboliu a lei que proibia os judeus de morarem em Portugal desde o final do século 15. Além de terem sido expulsos de Portugal, foram expulsos ou proibidos de residir em todas as terras do gigantesco império português. A partir de 1810 começam a chegar ao Rio de Janeiro os judeus da Inglaterra. No final das contas, pouco mais de 70 deles repousam no Cemitério dos Ingleses, na Gamboa, zona portuária do Rio, que era quase a beira mar na época.

Entre o "descobrimento" do Brasil e 1810, por trezentos e dez anos, recebemos um número muito grande de cristãos-novos, que construíram nossa nação junto com os cristãos-velhos, índios e escravos. A definição de ser cristão-novo ou descendente deles, não significa ser judeu. Caso fossem, não poderiam residir no Brasil.

Na visitação do inquisidor Heitor Furtado de Mendonça, no final do século 16, ao confeccionar seu relatório, faz menção à denúncias da existência de uma sinagoga (esnoga) na região de Camaragibe, cujo rabino seria Tomas Lopes, um cristão-novo. Na mesma visitação houve a denúncia contra Jorge Dias de Caja, um comerciante de Olinda, que seria um erudito e rabino. O jesuíta Furtado de Mendonça, entretanto, nada encontrou ou nada quis encontrar e esta estória se encerra sem desfecho algum.

A grande exceção aconteceu após a invasão holandesa do nordeste do Brasil. Foi uma guerra verdadeira entre holandeses e portugueses. Numa carta de 12 de agosto de 1636 ao governo holandês, os judeus do Recife afirmam que estavam construindo uma sinagoga e Symon Drago, comprou um "sefer" torá (rolo da torá), em 1633, em Amsterdã e trazendo-o consigo para o Recife

Ao contrário do que a história mal contada dos judeus no Brasil afirma e as pessoas repercutem por aí, não havia uma sinagoga do Recife holandês: havia duas. A mais antiga era a Congregação Maguen Abraham, na Ilha de Antônio Vaz (hoje bairro de Santo Antônio) fundada em 1637. Funcionava na casa de Joshua de Haro. Provavelmente é a tal sinagoga que consta da tal carta de 1636. Diz-se que aquele templo servia a judeus mais velhos que não conseguiam ir de barco à sinagoga principal, a Kahal Zur Israel (existente até hoje). A torá de Symon Drago, quase certamente, foi a torah daqueles judeus. O rabino Isaac Aboad da Fonseca, cujo nome correto é Abouhav, chegou apenas em 1641 e atuou na cidade até 1654.

Junto com ele veio da Holanda o pouco conhecido, Jehosuha Velozino, considerado um "chacham" (erudito nas leis judaicas) e ambos trabalharam juntos. As duas sinagogas se uniram em 1648. A Kahal Zur Israel atual não é o prédio original onde ela funcionava no sobrado, e onde havia duas lojas no térreo. O prédio atual foi construído por um comerciante português em meados dos século 19. Quando os holandeses foram expulsos do Brasil, 27 daqueles judeus foram com um grupo para o que hoje é Nova Iorque e o restante inteiro da comunidade voltou para a Holanda. O rabino Abouhav construiu a magnífica Sinagoga Portuguesa de Amsterdã, se tornou um dos maiores cabalistas da Europa, passou a seguir o falso messias Shabetai Tzvi levando consigo quase todos os judeus holandeses. Faleceu antes que Shabetai Tzvi, o tal falso Messias se convertesse ao islã, além disso, dar uma banana aos seus seguidores judeus. A principal sinagoga de Safed, em Israel, homenageia Abouhav da Fonseca.

Ambas situações envolvendo Holandeses e Ingleses são pouco lembradas neste dia. Lá pelos anos 1810 chegam os judeus marroquinos na Amazônia. Anos depois, parte viria ao Rio. Em 1829 estava fundada em Belém a sinagoga Shaar Hashamaim (Porta do Céu), cujo prédio atual é de 1947 (na foto). Judeus marroquinos de Belém também vieram para a capital, o Rio de Janeiro e junto com outros ahskenazitas de diversos países compunham a mínima comunidade judaica do Rio de Janeiro, e constituiram a primeira sinagoga do RJ em 1863, a União Israelita do Brasil (atual Shel Guemilut Hassadim). Posteriormente ainda no século 19 recebemos alemães e franceses (os quais constituíram uma sinagoga na Lapa). Os russos começam a chegar nos anos 1910, fugindo do Czar, e após a Primeira Guerra Mundial e a Revolução Russa se intensifica a chegada de judeus dos vários países envolvidos no conflito, inclusive judeus nascidos na Palestina. É também o momento da imigração para as colônias agrícolas do ICA no Sul do Brasil. É bom lembrar que o grande foco era a Argentina e muitos judeus somente se estabeleceram no Brasil após não conseguirem se estabelecer na Argentina, onde o "mercado" já estava saturado.

No entre guerras a imigração europeia, a árabe e a turca continuam, vários alemães fugindo do nazismo chegam a partir de 1933 e após a Segunda Guerra Mundial o país recebe sobreviventes do Holocausto em pequena quantidade. Para os sobreviventes de antes e depois do Holocausto, houve muita incompreensão e até mesmo recusas criminosas, por parte do governo Vargas, em barrar sua entrada no Brasil. Após a criação de Israel com a expulsão dos judeus dos países árabes, o Brasil acolhe sua última onda de imigrantes judeus: uma parte da comunidade egípcia, principalmente judeus do Cairo, inclusive líderes comunitários de lá em uma negociação na Itália intermediada por Sarah Kubitschek, cuja história completa é objeto do livro, "Noites de Verão com Cheiro de Jasmim" (Editora FGV, 2008).

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